Ceará
Geral
Crianças de 5 anos já são tratadas em decorrência da dependência de celular em Fortaleza; entenda.
Crianças com vício em celular têm graves transtornos mentais; entenda. Ansiedade, depressão e TDAH na lista dos danos.
Adeilania precisa conciliar,
pelo menos, quatro papéis diferentes no cotidiano: de esposa
do Érico; de mãe de dois filhos pequenos, Luiza, de 6 anos, e Paulo, de 5 anos;
de estagiária, oportunidade que conseguiu com esforço em janeiro e de estudante
do curso de Pedagogia, ainda no terceiro semestre.
Em casa, na tentativa de
manter o malabarismo diário, recorre ao celular para entreter as
crianças.
“Quando eu
estou com muita tarefa pra fazer, eles estão muito agitados, então, eu dou o
celular pra eles se acalmarem, assistirem a um filme, um desenho. Ali eles se
distraem, eu consigo fazer minhas coisas, consigo até estudar”.
Ainda assim, ela garante que
é muito criteriosa quanto ao tempo de exposição e ao conteúdo.
"Eu tento controlar o
que eles estão olhando e não deixo muito tempo, trinta minutos, no máximo,
porque é uma coisa muito viciante, eles querem estar o tempo todo com o
celular.”
O marido, Érico Brito,
frentista, também cede o celular, de vez em quando. “Hoje em dia é
bastante difícil, está muito incorporado na cultura o uso do celular, do
tablet, da televisão, canal por assinatura... Está muito na educação
deles", explica.
O Comitê Gestor da Internet
(CGI) e o Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade
(Cetic.br) têm dados que comprovam tal comportamento:
79,8%
das crianças
e adolescentes entre 9 e 17 anos são usuários assíduos da internet e 83% deles
têm o celular como principal dispositivo
Crianças entre 4 e 5 anos em tratamento: irritação
e reduzida tolerância
A psicóloga Tamara Maia, especialista no público
infanto-juvenil, conta que tem atendido crianças muito pequenas com um grau de
dependência alarmante.
As
crianças mais novas têm entre 4 e 5 anos. E as características que apresentam
são, principalmente, relação de apego, onde têm que ter o tablet por
perto, o celular por perto
Além disso, cita: "Outra característica é a
irritabilidade exagerada quando não se tem o objeto, seja por proibição, seja
por bateria fraca. A criança já demonstra uma baixíssima tolerância à
frustração, especialmente quando fica sem aquele objeto”.
No caso
de adolescentes, Machado identifica um crescente índice de casos de “isolamento
social, depressão e até tentativa de suicídio”.
O desenvolvimento neurológico também vem sendo
afetado. Muitas crianças já apresentam alteração no sono e quadros de insônia.
Tamara Maia explica que “essa luz que o celular emite e todo esse estímulo que
ele provoca faz com que a melatonina (hormônio que tem a função de
indutor do sono) entre em déficit".
Rendimento escolar e interação
social comprometida
No consultório de psicologia, a especialista
explica que as crianças não são levadas por apresentarem vício em telas, em si,
mas por causa dos efeitos secundários que a dependência gera e que, muitas
vezes, os pais nem percebem a causa.
“São crianças que têm uma dificuldade de ficar com
outras atividades que não seja o uso do celular, são crianças que passam um
tempo bem maior do que o esperado com o aparelho, que nas outras relações já
demonstram algum tipo de prejuízo”.
Ela também afirma que os pequenos podem apresentar
“transtornos desencadeados por conta desse uso: os principais são ansiedade,
depressão e, também, TDAH (Déficit de Atenção com Hiperatividade)
que muitos pais nem se dão conta já que, quando a criança fica ali, com a
tecnologia, parece que está muito focada mas a gente chama isso de hiperfoco”,
explica.
Crianças com essas características tendem a
apresentar déficits no rendimento escolar e dificuldade de interação
social.
Vício familiar: exemplo dos pais pelo celular chega
na criança
Além de todos as questões já citadas, uma em
particular chama atenção de, praticamente, todos os especialistas, os prejuízos
afetivos relacionadas à exposição constante das telas. As crianças que passam
mais tempo com celular do que em atividades reais com a família ficam mais
suscetíveis às doenças psicossomáticas.
Na
maioria dos casos, o uso abusivo do celular não se estende apenas aos pequenos.
Já é consequência do vício dos pais.
“A criança ela nasce com uma necessidade do outro,
do contato real com o outro e quando esse contato não é dado, e não é dado de
forma produtiva, ela apresenta uma série de questões e até mesmo comportamentos
inadequados na tentativa de ter essa atenção pra ela. Então é comum que os
pais, infelizmente, não se deem conta de que perdem um momento muito precioso
quando estão ali, né, voltados para o celular”, afirma Tamara Maia.
A terapeuta ocupacional Ana Nery Feitosa, do HUWC,
afirma que, às vezes, os pais nem percebem a negligência. Ela afirma que é
comum detectar situações em que “a criança pede o carinho da mãe e a mãe está
lá no celular, ‘agora não, que eu não posso’ e, vai ver, está fazendo coisas
que nem são tão importantes, né? Acontece muito”.
A universitária Artemmisia Oliveira, mãe do Rafael,
de 6 anos, conta que era bastante dependente do celular até o período em que o
filho tinha 2 anos. Segundo ela, era comum o uso em momentos importantes para
os dois.
Quando
ele ia mamar, mais à noite, eu ficava ali no celular, jogando. Dá até vergonha
de falar mas realmente eu fiz isso, né? Não foi legal, me arrependo, mas
acabava usando mesmo
Depois de perceber o vício, a mãe decidiu mudar
completamente a rotina. Hoje, só usa o celular para situações urgentes e nunca
na frente do Rafael. O menino, também, raramente usa o aparelho. Para os
especialistas, a principal recomendação é o equilíbrio. A tecnologia é
importante mas precisa ser usada com bom senso.
A psicóloga Tamara explica que “a criança aprende
muito através do exemplo, então, quando a gente fala algo pra ela, não vai
contar tanto como aquilo que a gente está fazendo”.
Muitas
vezes, os pais pedem para as crianças não usarem, mas estão ali, com o olho na
tela e pedindo. Aquilo não tem realmente um efeito efetivo para a criança
Ela sugere como ação a adoção de “combinados”, ou
seja, limites. “É importantíssimo que a criança tenha uma noção de até onde ela
pode ir em relação ao tempo de uso. E aí, depois que isso é estabelecido,
realmente, no dia a dia, cobrar que isso seja feito, mas também dando exemplo”,
explica Tamara.
(Diário do Nordeste)
(Foto: Colorado Parents)
Notícia mais recente
Próxima notícia
.png)



Deixe seu comentário
Postar um comentário